sexta-feira, 28 de junho de 2024

Divino de Amoníaco

Dia bucólico de concreto e aço,
e se é no inferno que renasço,
e para isso uma Fênix como
insígnia, é para a alusão de um
paraíso corrompido do cotidiano 
da humanidade que se reconhece 
em cada espécime que compõe e
corrompe esta civilização cada 
dia mais animalesca, e desta vez
um Deus branco misericordioso 
simbolizando o horror que todos
nós somos. Como poeta entre o
filho da luz e o crucificado eu
prefiro a prostituta. 
Contra mim Deus e o Diabo aliados,
meus versos feridos, conversa'fiada
em um diálogo de inimigos,
interlocutores imagem e semelhança 
de ambos, enquanto eu vim ao mundo 
com a cara de um e o focinho do outro. 

Qu'eu consiga dar conta de
toda a minha existência para que
esta existência não dê cabo de
mim, falo do devir fazer
de mim um tipo de pessoa que
abomino, e fazer brotar em meu
âmago um tipo de humanidade 
insuportável e destruídora. 

quinta-feira, 27 de junho de 2024

O dia D

A partir de
Amanhã será 
Ontem o dia de
Hoje como desde
Ontem
Hoje foste
Amanhã. 

terça-feira, 25 de junho de 2024

Última Vez de Novo

Meu próximo cigarro
será meu último. Meu
último dia de vida o
próximo, a última noite
passada ontem e, próximo 
de agora, minha
madrugada última...
e que não seja a
primeira de muitas 
como da última vez.

domingo, 23 de junho de 2024

Erro de Valor não Disponível

Em absoluto, o poeta,
desestabilizando-se:

-Absorto em absurdos!

Absorvido pelo pesadume de uma
existência absolutista e
aberrantemente bela, e 
Ela enquanto contraditória, 
ele medita:
   pensa em escrever sua mais nova
   obra prima, pensa em usar de leveza,
   mas pesam seus pensamentos pela
   cabeça de sobremaneira que um
   poema não nasce, mas desenvolve 
   material mental para sete novas ideologias
   e dissolve tudo o que já se elaborou sobre
   poesia até o presente instante. 
   E quando um verso ousa nascer,
   a inspiração abstrai  uma distração da pena,
   mais uma, e chama a atenção pro poema,
   tortos, os dedos, põe-se a escrever, mas fazem
   de má vontade, pois pensam em deixar a
   a escrita, antes que sucumbam retorcidos 
   para sempre:

para, diante do sempre,
minha poética, e recusa
a eternidade, e o esforço 
do tato dos dedos tortos 
trazem à tona       versos
profundos que valhem a
estima que     alcançam 
pela verve do poeta que
os concebe. Eis os versos:

Musa ensandecida,
uma fúria que se 
apresenta como a
poesia que esclarece,
ainda poesia mas,
agora ex-Musa de um
axioma da métrica 
que atrofia, e que
enobrece a fuga e o
cabresto usa como
látego  para açoitar
quem ousou podar
a inspiração:

Se não pode com a poesia
jamais ouse escrever,
ouça-a com os olhos
enquanto a declama o
silêncio,  pois sem perceber 
tua presença, os versos
deixam-se se envolver e
participam de você para o
resto de todo o sempre,
o mesmo sempre que 
a poética se recusa se
submeter, porém você, 
jamais será imune, pois
ninguém é imune a poesia 
e sucumbirá elevado,
queira ou não e mesmo que
não queira, tua vontade já 
será por conta do impacto
da poesia sobre vossa nobre
insignificância. 

Em resumo,
o que disse a poesia
que tu'alma jamais
tenha cogitado?

Nada. E mesmo que desconheça
o valor de nada,
tens a poesia equivalente que
tudo esclarece,
e se ainda assim não alcançar o
nada, você pode,
uma vez que esqueça teu corpo,
usar de tua alma
d e s m e d i d a m e n t e.


   

sexta-feira, 14 de junho de 2024

Futuro Póstumo

Um Buda raivoso 
Um Cristo com ódio 
Um Deus misericordioso.

Antítese como contra peso
e a tese revela-se como 
valor falso.

Um Poeta que escreve métricas 
Uma Poesia matemática 
Uma inspiração quadrada:

axioma como dúvida,
certeza subjetiva como máxima universal,
e a humanidade toda petróleo para máquinas de uma inteligência artificial 
obsoleta por si mesma à la seus criadores 
há milhões de anos.

Siderado

Um pássaro, uma nuvem,
uma aeronave, um satélite,
uma estrela próxima, outra 
distante, um exoplaneta, uma
galáxia inteira sendo devorada
por um buraco negro...

Uma célula, sangue, um
coração em diástole, uma
caixa torácica, um corpo inteiro 
sustentando uma cabeça repleta 
de pensamentos que vão pelo
subterrâneo das ideias, e as
reminiscências da memória 
devorando o próprio cérebro 
tentando pensar em algo novo
para escrever enquanto os olhos 
admiram a escuridão da porção 
vazia do universo.

quinta-feira, 13 de junho de 2024

Revolucionário

Eu que já sobrevivi a tantos
invernos não deveria morrer
assim sob o Sol, ou quem sabe
seja justamente por isso minha
                                           [morte.

Morrer visitando flores como uma abelha 
faz, depois de muitos outonos de cinzas
eternos, ou talvez quem sabe seja
justamente por isso a minha sorte.

E a fome seria tanta e geraria mais
fome a miséria se meus versos fossem
alimentos vindos da inspiração poética 

da minha persona preferida, do meu aspecto 
mais sombrio e ultra romantizado, vai-se
o comum promissor e fica o fracassado poeta.

sexta-feira, 7 de junho de 2024

Flos Dissector

Admirando flores meu faro
buscava em ti a percepção 
de tuas vestes de seda de Lótus,
mas minhas mãos rápidas e
gratas pelo dom do tato só 
pensavam em despir teu corpo
que a propósito da nudez
aguçaram também meus
destemidos olhos e eis que 
surge teu corpo nú,
desde o teu pensamento mais
altivo até teus obliquos calcanhares,
nua a presença do teu corpo
definido em imagem de Vênus,
fez-me a alma achar-se um Deus
grandiloquente, mas que em
silêncio prolixo repetia para
meu corpo um mantra que
aprenderá sete existências atrás,
e dizia:
              vá, ama, ame-a como o mar
              ama suas águas, como amar
              o mar sabe sobre suas ondas,
              vá, toma-a em teu destino e
              faça da beleza que cada poro
              dessa macia pele sugere tua
              única forma de pertencer a
              esta vida...

E desde então pus-me a viver
dissecando flores.

segunda-feira, 3 de junho de 2024

Decerto Deserto

Quando calo sou bem mais Eu
do que quando falo,
por isso canto,
silenciosamente em meu canto
e só quando quero,
por isso quero, e quando nego
o meu querer,
por instinto calo.

Eu seria dois Ases 
se um de mim fosse
um Ás.

Eu quisera um oásis
mas no caminho que preferi
só há veredas,
por isso eu sigo,
pois quando paro, e se paro,
é decerto para reparar no
deserto que ficou para trás, 
por isso espero,
e quando chego,
é quando parto.

E o vento faz-se areia e tudo
é sol e tudo é árido, 

e o tempo um pesadume que
torna forte quem por sobre
a vida inteira, por o levar em
conta, se encarrega de manter-se
jovem e em festa,
por isso calo, e envelheço, 
envileço como aço inoxidável 
que mata pela natureza do
ferro, do ferro do sangue
que a areia quente convida ao
solo, 
por isso eu sangro, 
e se mato também, 
morro no instante
do ato...
Calo o instinto que cantara, 
canto para minha morte
enquanto da ferida eu saro. 

Eu seria um só 
e do mar seria furiosa onda,
se eu não fosse só deserto
sendo assim a humanidade 
toda.



domingo, 2 de junho de 2024

Ex-voasse

Adorava bater as asas e
alçar voo,
adora o céu o seu voar,
e ele, adornava  o seu voo
com manobras nunca vistas
antes e com tal maestria 
fazia isso, que seu voar era
poesia, diziam. 
E o poeta que sabe adornar
a sua pena com rebeldia, 
jamais cairá  na ilusão de
achar que alguma métrica 
pode ser melhor que toda escrita
feita por inspiração. 
Parecer melhor é só estética. 
Assim ele voava,
voava por sobre tudo,
pois este tudo para ele
sempre foste pouco.

O Chão é pouco, o Muro é pouco,
as paredes, os Espelhos, as Vitrines...
A Cidade é pouca. A Humanidade, o
Mundo...

Meu céu são as copas das árvores, 
ele dizia, e agora podendo enxergá-las
lá de cima, dizia ser o chão do seu voo
as verdejantes e frondosas copas das
árvores.

Viveu intensamente feliz voando.
Porém, um dia teve uma queda fatal.
Durante um voo noturno por sobre
luzes que brilhavam lá embaixo, 
caiu em si a despeito de si mesmo,
e lembrou, e percebeu que não podia
voar, e então caiu...e assim morreu.