quarta-feira, 29 de abril de 2020

Velhos Versos

Meu cigarro já não queima mais do mesmo jeito, em meus dedos tortos que já não
seguram mais a pena do mesmo modo,
e escreve seus poemas com os mesmos

velhos versos
que já não são
mais os mesmos,
pois os versos,
como eu,
são reversos de
si mesmos e
mesmo assim,
como eu,
aos avessos ainda insistem em ser os mesmos.

Como a poética da chuva
e a paixão do fogo.

Sobre minhas virtudes,
não há rima possível entre minha existência
e a esperança de ser adepto das alegrias da vida, minha filosofia é a tristeza e a tristeza
é a inspiração maior das existências em
desalinho.

Meus passos já não
andam mais do mesmo
jeito, e o meu caminhar
cai por terra por não
querer pisar outro
caminho.

Vou seguindo pelo subsolo,
por outras rimas e outros
rumos, e para orientar-me
pelos astros à noite eu
volto à superfície,
surjo sempre mais escuro e sigo sempre mais sozinho.

Como a poética do fogo
e a paixão da chuva,
como os primeiros versos do primeiro texto
do mais antigo pergaminho.
Sózinho, mesmo sabendo que antes de mim
a solidão já escrevia seus cuneiformes na
argila das primeiras existências em desalinho.

Como a poética da paixão
da chuva pelo fogo,
igual a todas as minhas virtudes
de verve apaixonada pelos vícios
meus, de Deus e de seus demônios.

Meu coração já não bate mais do mesmo jeito,
ainda pulsa sangue atrás de pulsar vida,
mas a vida pulsa em repulsa por estar vivo.
Será doença, depressão, suicídio?
não, quanta tolice,
é só mais um poeta fazendo de suas
frases uma ponte entre a inspiração
e o declínio,
como o fogo sob a chuva,
sem mais poética nem paixão,
apenas cinzas e fumaça sobre
a brasa que se apaga e que
aos poucos vai sumindo,
subindo do meu cigarro
apagado no cinzeiro,
cemitério da virtude dos meus vícios.

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