quinta-feira, 11 de dezembro de 2025

Última Estrofe

Suicidou-se, de modo sui generis o verso.
Passou a lâmina da verve afiada nos
pulsos da poética. De ponta de metal
pesado a pena, cravou-a no peito do
poema e assim assassinou a poesia.
A poesia com seu sangue a escorrer da
ponta da pena, riscou em vermelho 
viscoso uma última estrofe que dizia que
não foi o verso o autor daquela morte,
ainda que o verso morrer quisera.
Disse a poesia no seu último suspiro
escrito que o assassino não poderia ter
sido outro senão o maldito poeta.
Mais tarde debruçado sobre versos 
mortos, o poeta também foi encontrado 
morto. Morreu de remorso e culpa, aliás,
matou-se pela dor de ver morrer sua
poesia, matou-se pelo arrependimento de
ter investido, digo, inventado a morte
daquilo que escrevia.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2025

Nada Sempre

O fim não acabou 
A manhã já entardeceu
O sol não expandiu
O céu não desabou:
Nada Aconteceu!
O poeta não morreu 
A poesia não ressuscitou 
Deus não se reinventou
(onde o nada existe, o
rei perde seus direitos)
e já não existe mais na
maioria dos lugares.
O mundo não acabou ou
não para mais de acabar,
alhures...e aqui...
Nada Aconteceu!

domingo, 7 de dezembro de 2025

Pequena Ode ao Ódio

Farto ódio devasso,
de fato, composto 
de vasto domínio 
sobre mim,
compõe-me,
percebo que à
contragosto,
porém, pouco
me importa,
pois por todo
esse ódio jamais 
morri de amores,
ou seja, eu o odeio 
também, e ademais,
diria que eu o odeio horrores:

eu, 
o ópio dele e,
Ele,
meu ócio,

eu dele o oposto 
e ele o meu óbvio:

Ódio é uma dádiva 
dentro da glória de
odiar, e se Deus é
odioso e eu o amo,
meu ódio é Deus,
meu Deus meu Ódio.

sábado, 6 de dezembro de 2025

Amanhãs

Para onde vão todos os nãos
utópicos não haverá manhãs...
não há, tampouco nunca houve,
e o que tiver, 
se houver doravante,
nos diz tópicos,
será muito pouco
um breve e tardio 
futuro para todos
os habitantes do hoje.

Eu venho de ontem.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

Atrás Iriam

Tartarugas
tardam    o
tempo,     o
tempo
todo. Tantas
tartarugas 
se atrasam,
ousam não,
mas sabem
sim,
atrasariam,
quantas e
muitas:
todas diriam
que são todas,
todas as
tartarugas.
Porém,
poucas
partem antes.

segunda-feira, 17 de novembro de 2025

Transpassado

Todas as esperanças e sonhos 
que há muito vinha cultivando 
dentro de mim, 
do meu Ser adentro,
todas estas vontades e desejos,
são coisas antigas do futuro:
antigas, gastas e obsoletas, pois
são aspirações que já não mais
me apetecem, coisas que não 
quero mais e que não mais
espero que aconteçam.
Não desejo ser nada além 
daquilo que sou, e o além de
mim que desejo, é de mim para
o mundo, para os outros e para
o tempo, e não o contrário. Do
futuro e suas velharias tecnológicas
eu nada quero, desejo mesmo são 
as novidades de um passado que
no presente daquele tempo foram
ignoradas ou suprimidas. 
O horizonte que me agrada não é
o que está em minha frente,
mas àquele que está à frente de
qualquer tempo, em qualquer época,
transpassado ou não, um pórtico 
por onde posso passar de ida e volta quantas 
vezes julgar necessário:
assim como um livro...
um livro que lembra e pensa em cada
leitor que já o leu, e não fica a pensar
naqueles que por ventura um dia o
lerão.

Se só o passado já 
foi escrito, por que
perdemos tempo
tentando ler o futuro?

terça-feira, 11 de novembro de 2025

Solidão Insólita

Estatizo minha morte.
Me isolo para não me
sentir só, e então a sós,
minha companhia 
abandono a própria 
sorte.